por Karine César
Despedir-me do sol, no dia 31 de dezembro, não foi tarefa fácil. Questionei-me várias vezes se estava fazendo a coisa certa de abandonar aquele dia maravilhoso na praia para subir à "Selva de pedra" e correr pelos corredores de concreto. Mas, tinha um compromisso com a São Silvestre e, principalmente, comigo. Confesso que, mesmo amando correr, a tradicional prova nunca foi meu sonho. A data era meu maior empecilho porque sempre estava viajando nesta época. Ano passado, no entanto, eu ficaria no litoral paulista e em uma hora estaria em São Paulo. Era o momento perfeito para me inscrever em uma das provas mais comentadas do mundo. Tudo estava perfeitamente organizado. Subiria no dia 31, correria, voltaria para a praia e fecharia meu ano nas areias do Guarujá. Tudo feito, mas eu não contava com a famosa preguiça. Quando vi o sol entrando pela janela e todos os meus familiares e amigos vestidos para praia, o arrependimento veio à tona. Porém, eu tinha que continuar não importava o quanto fosse difícil. Já coloquei o short, o top, a camiseta e o tênis para entrar no clima e não cair na tentação de vestir um biquíni. Despedi-me de todos e vi nos olhos de cada um certo grau de orgulho (ou seria de perplexidade com a minha "loucura"). Bom, não importa. Prefiro pensar que foi a primeira opção. Pronto, agora estava pronta para enfrentar o desafio. Falei para mim mesmo: será a primeira e última São Silvestre! Cheguei em São Paulo quase quatro horas antes da largada. Relaxei um pouco, mas o nervosismo é inevitável. Quando cheguei na estação Trianon-Masp, tive idéia da magnitude do evento. As escadas rolantes estavam lotadas. Parecia até horário de pico. Mas, ao invés de ternos e gravatas, shorts e camisetas desfilavam pela avenida. Não havia mais espaço.Tentei me espremer entre os outros atletas para conquistar um lugarzinho mais perto da largada. Enquanto aguardava o início da prova, fui me distraindo com o pessoal fantasiado. Aquelas figuras que a gente vê na tevê e acha o máximo. Na hora, no entanto, a única coisa que passava pela minha cabeça era como eles corriam com tanta roupa com aquele calor que fazia. Eu já estava passando mal e estava com tão pouca roupa. Mas, eles são um show à parte. A prova é por si só uma sensação! Foi dada a largada. Caminhei até perto do tapete. Depois, passei para uma corrida leve. Ainda não estava no meu ritmo. Era muita gente e todos estavam no mesmo passo. Tentava desviar, mas era bem difícil. Procurei ficar na minha. Na descida da Consolação, comecei a prestar atenção nas pessoas que estavam assistindo. Elas realmente vibram junto e são a graça de tudo. Os gritos das pessoas me fizeram arrepiar. Nunca tinha passado por uma experiência assim. Realmente, a prova é emocionante e única. Já estava feliz por estar participando. Conforme fui chegando ao sétimo quilômetro, o ritmo foi caindo. Fui sentindo um mal-estar... Internamente, eu pensava: será o calor, a falta de treino, os quilos extras... Afinal, o que estava me fazendo "quebrar" (jargão para quando você perde o pique na corrida)? Minha cabeça estava a mil. Eu, realmente, tinha que ter perdido uns três, quatro quilos para correr mais leve. Faz uma diferença! E a musculação que eu parei? Ah, sim, era ela a culpada. Afinal, não estava cansada, mas minhas pernas não me obedeciam mais. Refleti mais um pouco e assumi para mim mesmo que a única culpada era eu. Faltei muitos dias aos treinos na pista de atletismo do Ibirapuera. Meu treinador (Wanderlei) tentou me alertar. Mas, convenhamos acordar às 5h30 quase todos os dias para quem chega do trabalho depois das dez da noite em casa, não é tarefa simples. Eu estava pagando – bem alto - pelos meus erros. Não havia justificativa. Mesmo assim, tentei curtir o percurso. Em cada esquina, via um rosto de esperança. De repente, um gritava "falta pouco", "já ta chegando", "veio aqui para correr ou para andar", "aumenta o ritmo". Na hora, eu xinguei internamente, tenho que confessar. Só eu sabia o esforço que estava fazendo. Definitivamente, não era meu dia! Entretanto, um minuto depois, lembrava que aquelas pessoas estavam ali de bom grado, tentando nos ajudar e eu os recriminando. Nas ruas do centro, as pessoas saíam de casa com mangueiras e molhavam os atletas para diminuir a nossa dor. Isso não tem preço. Os expectadores compartilham cada momento de emoção com a gente. Não há como explicar. Diminui bem o meu ritmo, mas não parei de correr em nenhum minuto. Essa era a minha meta. Fiz 1h34m. Um tempo muito aquém do que eu esperava. Eu posso colocar a culpa em várias coisas. Na realidade, todo atleta que não chega no tempo estabelecido, arranja uma ou várias desculpas para justificar seu mal-desempenho. No fundo, nos mesmo somos os culpados. Eu assumo o meu: fiz tudo errado o ano passado. Faltei aos treinos, não me dediquei com afinco e comi tudo errado. Eu havia me comprometido com a editora da revista Corpo a Corpo e com o meu técnico a fazer tudo certo até a São Silvestre. Falhei, mas aprendi muitas coisas sobre corrida nesses quase três meses de preparação. Afinal, nunca havia treinado com o acompanhamento de um especialista. E faz muita diferença! O saldo positivo é de que a partir de agora não subestimo mais os treinamentos, serei tão solidária com as pessoas como elas foram comigo durante o percurso e, mesmo não tendo me superado, eu pelo menos queimei mais ou menos umas mil calorias e passei o reveillon mais leve. Pelo menos, até o momento da ceia... No início, falei que seria a minha primeira e última São Silvestre. Agora, já não sei. O que importa é que quero treinar muito para não ficar mais brava comigo. E se vale uma dica: corra, pelo menos uma vez a São Silvestre. Você não vai se arrepender. Assim como eu não me arrependi. Pelo contrário, amei!
* Karine César é editora da revista Dieta Já, da Editora Símbolo
quarta-feira, 16 de janeiro de 2008
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Um comentário:
Oi Karine lindo seu relato,adorei, essa foi minha 12ªSS, tive seriosprblemas mas conclui, passe em meu blog e leia o relato,vai gostar...(vivendoecorrendo.blogspot.com) um abraço..Regis- sp
Postar um comentário