quarta-feira, 22 de abril de 2009

13.1 milhas em Fort Lauderdale


por Fernanda Paradizo

Sempre fui crítica em relação a fazer provas no exterior e todas as vezes que optei por correr lá fora acabava preferindo corridas tradicionais, que me dessem a certeza de que seria uma boa escolha. Pela primeira vez, resolvi arriscar. Como eu estava indo no final do mês de outubro de 2008 para fazer a cobertura da Maratona de Nova York e na seqüência emendaria um outro trabalho, no Mundial de Ironman 70.3, em Cleartwater, na Flórida, imaginei que poderia finalizar minha estadia nos Estados Unidos com uma meia-maratona, distância da qual venho virando fã nos últimos dois anos, já que não é necessário muitos meses de treino para se preparar adequadamente.

Quando fiz para a Contra-relógio o guia das “20 Meias-maratonas imperdíveis”, publicado no mês de setembro, já estava à procura de uma prova que conseguisse encaixar no meu roteiro de viagem, para unir o trabalho com o prazer de correr. Numa busca pela internet, entrei no site da Maratona e meia maratona de Miami, que me remeteu a uma série nova de quatro meias-maratonas, intitulada 13.1 Marathon Series, número referente à quantidade de milhas corresponde a uma meia.

A abertura oficial seria em Fort Lauderdale, na Flórida, dia 16 de novembro, uma semana após o Mundial. Era perfeito. Eu iria para Nova York, pegaria um vôo para Miami, de onde alugaria um carro e pegaria a estrada com destino a Clearwater para cobrir o Mundial de 70.3. E, de lá, iria direto para Fort Lauderdale, onde passaria a semana, dando conta de alguns trabalhos que carregaria das duas coberturas e aguardando a chegada de um grupo de amigos, que também topou o desafio. No final das contas, estávamos em seis brasileiros.

Treinei para a prova não como gostaria, mas, faltando uns 45 dias para a competição, consegui encaixar alguns treinos bons de velocidade, o que me deu uma certa segurança. Estudei alguns resultados de meias na Flórida e, com a minha experiência de Meia da Disney, sabia que, se corresse perto do que eu estava acostumada, cerca de 1h43min, poderia beliscar um lugar na minha categoria. Como o evento era pequeno, com não mais que 1.200 pessoas, e inaugural, não havia muito o que estudar sobre a prova. Por informações de pessoas ligadas à organização, sabia apenas que boa parte dela seria realizada na famosa A1A, avenida da praia, que também não significava muito para mim, já que eu não conhecia essa região da Flórida, que fica a apenas 24 milhas de Miami. Mas claro que o fato de correr à beira-mar me enchia de expectativas. A largada marcada para às 6h13 da manhã, com o nascer-do-sol, como na Maratona de Miami, me fez imaginar que a temperatura ali não deveria ser muito amena. Mas tudo bem. Isso não era problema. No final das contas, o que eu queria mesmo era poder correr uma meia e fechar minha estadia nos Estados Unidos com chave de ouro.

Fiz minha inscrição pela internet pelo site MarathonGuide.com ao valor de 59 dólares, já com taxa. Como novembro não era época de alta temporada, boa parte do grupo conseguiu usar milhagem para a passagem aérea, reduzindo assim o custo da viagem. Optamos por ficar a semana da prova em Fort Lauderdale mesmo, até porque os hotéis ali estavam bem mais em conta. Por 85 dólares a diária, ficamos em quatro mulheres num hotel quase à beira-mar, a duas quadras da A1A, onde passaria boa parte da prova.

A semana demorou a passar em Fort Lauderdale. Nos dias anteriores, deu para fazer bastante coisa, inclusive correr na A1A no horário da competição e perceber que o vento seria nosso grande limitador no dia da meia. Os dias passavam e ele ainda estava ali, sempre dando o ar da graça, às vezes ventando de frente, às vezes de lado. Avaliamos que, em ambas as situações, comprometeria nossa corrida. Muito pouco, ou nada praticamente, se ouvia da prova na região, a não ser nas lojas de esporte especializadas, onde foram feitas a entrega do kit, que era muito simples. O que chamava atenção era o sistema de chip descartável, uma espécie de tira de papel para colocar no cadarço.

Como ali todos estavam unindo férias com a corrida, em nenhum momento ninguém se mostrou muito paranóico com a prova. A única coisa que de fato nos preocupava um pouco era para onde sopraria o vento. Os dias passaram e a discussão do vento também deixou de fazer parte das nossas rodas de bate-papo. No entanto, na sexta antes da meia, fomos informados de que até domingo ele daria uma amenizada a passaria a bater mais lateralmente. Menos mal.

Nesse meio-tempo, nosso "grupo de seis" ganhou mais um integrante às vésperas da prova. O amigo Clayton Rocha, que tantas vezes correu conosco quando morava em São Paulo, há oito anos, e, mesmo sem nenhum treino, resolveu se unir a nós e também encarar a desafio da meia-maratona. Além da companhia de mais um amigo, também ganhamos um jantar de massas em Weston, condado de Miami, oferecido pelo Clayton e por sua esposa no sábado, véspera da prova.
Tudo estava pronto para o dia seguinte. Como a largada ficava muito próxima do nosso hotel e a prova era pequena, fizemos algumas contas e achamos que poderíamos chegar ao local uns 45 minutos antes e fazer as coisas com calma e sem atropelo. Foi tudo perfeito. A largada acontecia na 17th Street, perto do Port Everglades e do The Broward Convention Center. O percurso seguiria por um trecho da US 1/Federal Highway, onde teríamos que passar por baixo de um túnel. De lá, viraríamos na famosa e badalada Las Olas Boulevard, onde correríamos até o mar, com cerca de 4 milhas de prova, para começar o trecho de praia, de ida e volta.

Usamos o guarda-volume da organização, que eram dois ônibus escolares, daquelas amarelos que se vê em filme, como na Disney, e fomos aquecer pertinho da largada. Quando faltavam 5 minutos, entramos na única baia que havia e nos posicionamos bem à frente. O público era bem diferente daqueles vistos em maratona e meias-maratonas internacionais. Não conseguimos avistar ninguém que pudesse afirmar que seria um candidato à vitória, até porque deu para perceber que era uma competição de amadores. Mas bons e rápidos amadores, diga-se de passagem. Ali mesmo na largada pudemos perceber também a quantidade de mulheres que havia na prova, numa proporção muito maior do que a de homens, como também acontece na Maratona e Meia maratona da Disney. Bom, se eu ainda almejava algum lugar na categoria, era só olhar para os lados e ver que minhas adversárias estavam exatamente ali. Percebemos também a presença de vários brasileiros, tanto locais quanto turistas.

Depois do hino nacional norte-americano, a largada foi dada pontualmente às 6h13 da manhã, com o dia ainda escuro. Saíamos como um foguete junto com o pelotão de frente. Por um momento, esqueci que a prova era em milha, mas sabia que estava correndo um pouco mais rápido que o ritmo habitual para uma meia nas minhas atuais condições. Embora tivesse um tempo de planilha de 1h45 para seguir, sabia que poderia fazer algo em torno de 1h43, que é o que me garantiria um lugar entre as cinco primeiras na minha faixa etária. Eu teria apenas que descartar a Elaine Serrano, da mesma categoria, que estava no nosso grupo e que eu tinha a certeza que seria mais rápida do que eu.

Apesar de estar um pouco desencanada, eu tinha uma estratégia, que era correr todas as milhas abaixo de 8 min e ir sentindo o ritmo no caminho. Passei a primeira milha a 7min28s. Sabia que estava rápido, mas deixei que o ritmo de meia-maratona se encaixasse sozinho, sem me preocupar muito em segurar, até porque eu poderia ter que lutar com um vento contra na parte da praia e, como eu estava me sentindo bem, eu poderia ter esses segundos a meu favor no tempo final. A Elaine veio junto comigo e, a partir da milha 2, foi sumindo aos poucos da minha visão. Fiquei um pouco mais atrás. Na milha 2 veio também o primeiro posto de hidratação da prova. Eram apenas duas mesas, com vários staffs gritando “Gatorade” e “water”. Embora assustada com a pequena estrutura, consegui pegar água sem problemas.

Veio a milha 3 e, na passagem por debaixo do túnel, chegou a hora da primeira subidinha da prova. O ritmo caiu um pouco, mas estava tudo sob controle. Entramos na milha 4 e ali presenciei uma das cenas mais lindas da corrida. Passamos pela ponte da famosa Las Olas, pegamos uma leve subida e demos de frente para o mar, com o sol ainda nascendo. Parecia uma pintura. A temperatura estava bem anema, com apenas um pouquinho de umidade, mas que não atrapalhava em nada nossa performance.

Vários grupos passavam por mim em blocos e não consegui me encaixar em nenhum deles. E as mulheres ali sempre presentes, muitas vezes dando o ritmo ao grupo. Entrei na praia correndo sozinha, sem ninguém à minha frente que eu pudesse tentar me esconder do vento contra, que eu aguardava pelo menos para as próximas 4 milhas de percurso. E claro que ele estava lá. Mas, para sorte de todos, não era contínuo. Batia mais de lado e vinha em rajadas. Era suportável. Caí um pouco o ritmo em função disso, mas estava tudo bem, já que eu sabia que, quando retornássemos pela praia, ele estaria a favor. Passei os 10 km para 47min59s, sentindo-me um pouco cansada, mas num ritmo bom para uma meia, bem próximo da sensação que eu estava acostumada. Talvez um pouquinho mais forte. Mas isso não me abalava. Projetei ali meu tempo de prova para 1h42min, o que era bom, considerando que minha melhor marca de meia é 1h38min, em Lisboa, e com treino completamente direcionado, sem percalços pelo caminho.

Com a passar das milhas, fui percebendo também que havia feito a escolha errada do tênis de corrida, que era muito leve e nada acolchoado. Mas pelo menos estava conseguindo administrar bem o vento e também o fato de correr sozinha. Uma mulher passou como uma bala por mim e disse para eu relaxar braços e ombros, alertando para o fato de eu estar correndo muito tensa. Segui seu conselho e tentei me policiar para correr mais relaxada. Enquanto me encaminhava para a virada na praia, demorou para avistar a passagem dos líderes do outro lado. Desconcentrei e não vi também a passagem da Elaine, que a essa altura deveria estar bem à minha frente. Fiz o retorno e me senti aliviada por deixar as rajadas de vento para trás. Do outro lado do percurso, vi todos os amigos ali e um reflexo do que a essa altura da prova havia acontecido com cada um deles.

Concentrei-me na chegada e corri as quatro últimas milhas praticamente sem apreciar o lindo visual que estava à minha esquerda. Nesse momento, consegui manter o ritmo um pouco mais forte e passei por várias mulheres. Na última milha, praticamente sem muito incentivo, já que o percurso era vazio de expectadores, fiz uma conta muita rápida e acreditei que pudesse finalizar os 21 km na faixa de 1h41min. Apertei o passo e cruzei a linha de chegada em 1h41min58s. Ouvi meu nome e um “from São Paulo” sendo anunciados nos microfones. Terminei cansada, mas inteira e feliz com o resultado. Encontrei a Elaine ao final, que havia corrido a meia para 1h37 e conseguido seu recorde pessoal na distância. Os amigos foram chegando e ficamos ali curtinho o final de prova e a beleza do lugar. Na hora da premiação, a surpresa: fui a 3ª colocada na categoria. Como eu já havia previsto, a Elaine garantiu a 1ª colocação. O amigo Clayton Rocha, que pouco ou nada estava treinando e que fez a prova apenas para nos acompanhar e relembrar os velhos tempos, mostrou que ainda carrega resquícios da época em que fazia meia-maratona para baixo de 1h30 e garantiu também um lugar no pódio (4º lugar, com 1h53min), com um tempo bem mais modesto do que estava acostumado quando treinava no Brasil, mas feliz por rever os amigos e poder reviver momentos que há muito não vivenciava. No final de tudo, percebemos que mais um brasileiro foi destaque no pódio, o Gustavo Schmidt.

Saíamos dali felizes, todos com a medalha no peito. Paramos num Starbucks para brindar a excelente manhã de corrida com um café. Vimos mais um grupo de brasileiros locais, que também haviam feito a prova. Deixamos o Starbucks já com saudades de tudo o que vivemos em Fort Lauderdale e com a certeza de que teríamos que repetir a dose numa outra oportunidade. A receita para o sucesso, já sabemos: tem que ser meia-maratona, muito pouco ou nada badalada e num lugar lindo e maravilhoso como Fort Lauderdale. Existe coisa melhor?

PONTOS A FAVOR
Lugar
: Pagando uma diária de 85 dólares, em quatro pessoas, dá para se instalar bem ali. Isso sem contar que o lugar é maravilhosa e fica apenas 40 minutos de carro de Miami.
Locomoção: Sem carro não se vai a lugar nenhum na Flórida. Vale à pena alugar um para dar alguns passeios pela região. Fomos várias vezes a Miami e visitamos a famosa ilha de Key Biscayne, onde tivemos a oportunidade de ver o magnífico pôr-do-sol e a melhor vista da cidade de Miami.
Comida: Bem próximo de onde estávamos hospedados, havia um supermercado Publix, onde pudemos comprar de tudo e fazer comida no próprio hotel. Na hora da escolha onde ficar, vale à pena se certificar de que o hotel tenha cozinha.
Compras: Dizem que Miami é o lugar das compras, mas em Fort Lauderdale os preços são de arrepias, além de a taxa ser um pouco mais baixa (6%). Comprei casado de frio da Oackley por 35 dólares. Os outlets são imperdíveis. Os preços de tênis não variam muito de um lugar para outro, mas tem algumas opções bem baratas, embora seja difícil encontrar numeração e a cor desejada.
Passeios: As praias e os canais são lindos e fantásticos. A convite da irmã de um dos colegas, do Peter, fomos remar nos canais. Estávamos em 10 pessoas e foi muito bacana. Mas sorte que fizemos isso a seis dias da prova, porque no dia seguinte todos estavam com dor nas costas pelo esrforço.
Trabalho: Essa dica provavelmente não cabe para muita gente, mas vale informar. Vale levar o laptop para trabalhar. A conexão dos hotéis e ótima e de graça. Meu grande problema para trabalhar ali era que os amigos iam para a praia enquanto eu ficava trabalhando. Quando voltavam, sempre muito animados, era difícil manter a concentração. Ossos do ofício.
Brasileiros: A surpresa da prova foi encontrar uma grande quantidade de brasileiros. Perdi a conta. Os turistas, como nós, era possível identificá-los pelo jeito e também pelo tipo de roupa. Muitos trajavam as camisas das nossas provas no Brasil ou mesmo as camisas de suas assessorias.
Percurso: Plano quase total, com duas subidinhas muito leve. Demos sorte porque o vento contra que marcou nossa estadia nos dias anteriores resolveu bater mais de lado e não tão constante, o que de certa forma não atrapalhou a prova. Apesar de segurar em alguns momentos na ida, na volta funcionou a nosso favor.
Largada: Muito tranqüila. Correr à beir-mar ali com aquela imensidão azul sem fim é uma das imagens mais bonitas que guardo da prova.
Expectadores: Não espere por gente torcendo no percurso. Por ser uma prova pequena e ser realizada nas primeiras horas da manhã, não tem ninguém. É você com você mesmo. Mas a beleza do percurso supera isso.
Postos de hidratação: Apesar de pequenos, os staffs gritavam avisando o que era água e o que era Gatorade. Não tinha erro. Dava apenas uma pouco de aflição quando avistávamos duas mesinhas pequenas, a cada 2 milhas, para dar conta dos corredores. Como não sou muito de parar e quebrar o ritmo, tinha sempre a impressão de que não ia conseguir pegar água ou que poderia me atrapalhar e pegar o Gatorade. Mas tudo bem.
Marcações milha a milha: Eram bem visíveis. Não tinha como errar.
Público feminino: Havia muita mulher correndo entre 1h38 e 1h45. O nível das corredoras é muito semelhante e a briga pelas faixas etárias é boa, principalmente durante a prova, quando você vê a quantidade de mulheres correndo no seu nível.
Jantar de massas: Não havia jantar de massas. Mesmo assim, não ficamos sem o nosso. Fomos convidados para ir a Weston, na casa do amigo brasileiro Clayton, que nos serviu um jantar maravilhoso.
Medalha: Uma das mais lindas que já ganhei, tanto a da prova quanto a da categoria.

CAMPEÕES
Cobi Morales (South Miami, FL) – 1h15min28s
Natasha Yaremczuk (Paris, ON) – 1h27min34s

BRASILEIROS
Elaine Serrano – 1h37min11s (1ª na categoria 40-44 anos)
Gustavo Schmidt – 1h39min01s (3º na categoria 55-59 anos)
Fernanda Paradizo – 1h41min58s (3ª na categoria 40-44 anos)
Peter Dualibi – 1h49min38s
Lígia Sanches – 1h50min07s
Clayton Rocha – 1h53min04s (4º na categoria 60-64 anos)
Monica Peralta – 2h32min57s
Simone Machado - 2h32min57s

13.1 MARATHON SERIES
01/03/2008 – Miami, FL
04/10/2008 – Atlanta, NJ
07/06/2008 – Chicago, IL
15/11/2009 – Fort Lauderdale, FL

Um comentário:

Maratona das Cataratas do Iguaçu disse...

Galera Run For Life !
Estamos seguindo e lendo seu blog. Inclusive colocamos entre nossos favoritos. Convidamos você, para conhecer nosso blog. Se quiser seguir, para nos será um prazer.